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terça-feira, 21 de dezembro de 2010
"Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça"
Esta bem-aventurança visa sobre tudo os insatisfeitos, os descontentes consigo mesmos,os que sofrem o tormento do Infinito, a nostalgia do Eterno, os que vivem ou agonizam numa estranha inquietude metafísica, os que crêem mais no muito que ignoram do que no pouco que sabem.
Antes de tudo. convém esclarecer o que aqui se entende pela palavra "justiça". Esta palavra, toda vez que ocorre nas sagradas Escrituras, significa a relação ou atitude justa e reta que o homem assume em face de Deus. Não se refere à justiça no sentido jurídico, do plano horizontal, como é usada na vida social de cada dia. Justiça é, pois, a compreensão intuitiva de Deus(a mística) e o seu natural transbordamento na vida cotidiana(a ética).
Jesus proclama felizes os que têm fome e sede dessa experiência íntima, os que estão insatisfeitos com o pouco ou muito que alcançaram no caminho árduo da sua cristificação. Sabem que estrada imensa lhes resta ainda a percorrer; mas sabem que é glorioso continuarem a andar rumo ao seu grande destino.
Para que o homem sinta em si essa espécie de nostalgia metafísica, deve ele ter ultrapassado certas fronteiras de vivência comum. O homem que ainda vive totalmente engolfado nos afazeres da lufa-lufa comum dos profanos, caçadores de matéria morta e carne viva, esse não está maduro para ter fome e sede de um mundo invisível. Antes de sentir essa fome, terá de experimentar o fastio de que agora tem fome."Quem bebe desta água(das coisas materiais) torna a ter sede(das mesmas); mas quem beber da água que eu lhe darei, esse nunca mais terá sede(das coisas materiais)"porque esta água se lhe tornará numa fonte que jorra água para a vida eterna.
O divino Mestre proclama felizes os que sofrem essa fome e sede da experiência de "Deus",porque eles serão "saciados". É certo que, um dia, em outros mundos, essa nostalgia será satisfeita, porque a natureza não engana seus filhos,impelindo-os a um alvo fictício.
Ainda que o infinito em demanda do Infinito tenha sempre diante de si um itinerário ilimitado, e jamais chegará a um ponto onde lhe seja vedado progredir ulteriormente- porque não há "luzes vermelhas" nos caminhos de Deus-é certo que o humano viajor chegará a um ponto em que a sua compreensão e amor de Deus o tornará profundamente feliz.
Do "Sermão da Montanha",páginas 37 a 39(2003)-Editora Martin Claret-Coleção a Obra-Prima de Cada Autor.
Antes de tudo. convém esclarecer o que aqui se entende pela palavra "justiça". Esta palavra, toda vez que ocorre nas sagradas Escrituras, significa a relação ou atitude justa e reta que o homem assume em face de Deus. Não se refere à justiça no sentido jurídico, do plano horizontal, como é usada na vida social de cada dia. Justiça é, pois, a compreensão intuitiva de Deus(a mística) e o seu natural transbordamento na vida cotidiana(a ética).
Jesus proclama felizes os que têm fome e sede dessa experiência íntima, os que estão insatisfeitos com o pouco ou muito que alcançaram no caminho árduo da sua cristificação. Sabem que estrada imensa lhes resta ainda a percorrer; mas sabem que é glorioso continuarem a andar rumo ao seu grande destino.
Para que o homem sinta em si essa espécie de nostalgia metafísica, deve ele ter ultrapassado certas fronteiras de vivência comum. O homem que ainda vive totalmente engolfado nos afazeres da lufa-lufa comum dos profanos, caçadores de matéria morta e carne viva, esse não está maduro para ter fome e sede de um mundo invisível. Antes de sentir essa fome, terá de experimentar o fastio de que agora tem fome."Quem bebe desta água(das coisas materiais) torna a ter sede(das mesmas); mas quem beber da água que eu lhe darei, esse nunca mais terá sede(das coisas materiais)"porque esta água se lhe tornará numa fonte que jorra água para a vida eterna.
O divino Mestre proclama felizes os que sofrem essa fome e sede da experiência de "Deus",porque eles serão "saciados". É certo que, um dia, em outros mundos, essa nostalgia será satisfeita, porque a natureza não engana seus filhos,impelindo-os a um alvo fictício.
Ainda que o infinito em demanda do Infinito tenha sempre diante de si um itinerário ilimitado, e jamais chegará a um ponto onde lhe seja vedado progredir ulteriormente- porque não há "luzes vermelhas" nos caminhos de Deus-é certo que o humano viajor chegará a um ponto em que a sua compreensão e amor de Deus o tornará profundamente feliz.
Do "Sermão da Montanha",páginas 37 a 39(2003)-Editora Martin Claret-Coleção a Obra-Prima de Cada Autor.
domingo, 5 de dezembro de 2010
"Bem-aventurado os pacificadores"
Pacificador é, pois, aquele que faz a paz, é um "fazedor de paz", um homem que possui em si a força creadora de estabelecer ou restabelecer um estado ou uma atitude permanente de paz no meio de qualquer campo de batalha.
Quem é, pois, verdadeiro pacificador?
Não é, em primeiro lugar, aquele que restabelece paz entre as pessoas ou grupos litigantes, mas sim aquele que estabelece e estabiliza a paz dentro de si mesmo. Aliás, ninguém pode ser verdadeiro pacificador de outros, se não for pacificador de si mesmo. Só um autopacificador é que pode ser um alo-pacificador.
Todos os conflitos externos são filhos de algum conflito interno não devidamente pacificado. Por isto, é absurdo querer abolir as guerras ou revoluções de fora, as discórdias domésticas no lar ou no campo de batalha, enquanto o homem não abolir primeiro o conflito dentro da sua própria pessoa.
O grande tratado de paz tem de ser assinado no foro interno do Eu individual antes de poder ser ratificado no foro externo das relações sociais. Nunca haverá Nações Unidas, nunca haverá sociedade ou família unida enquanto não houver indivíduo unido.
A verdadeira paz é um carisma divino, uma graça, uma dádiva de Deus, que é dada a todo o homem que se torna receptivo para receber esse tesouro. A verdadeira paz não pode ser manufaturada pelo ego humano, porque esse ego é o autor de todas as discórdias que existem sobre a face da Terra. Só quando esse pequeno ego humano se integra no grande Eu divino é que pode surgir uma paz duradoura.
Quem tem firme consciência de possuir a plenitude do ser pode facilmente renunciar à abundância do ter. Quanto maior é o ser de uma pessoa, menor é o seu desejo de ter; e, como toda a falta de paz nasce do desejo de ter, e ter cada vez mais, é lógico que o homem que reduziu ao mínimo o seu desejo de ter, não tem motivo para perder a paz.
A paz é, pois, um atributo do ser, é algo qualitativo, algo que tem afinidade com o EU SOU do homem. O homem que tem plena consciência do seu divino EU SOU não tem motivo para brigar ou declarar guerra a alguém por causa dos teres , que desunem os profanos.
Por isto, em vez de brigar por causa da capa que alguém lhe roubou, esse milionário do ser oferece tranqüilamente ao ladrão também a túnica, porque nem a capa e nem a túnica fazem parte do seu ser. E, destarte, ele não sofre perda alguma real: perda dois zeros em vez de um zero, mas a perda de dois zeros(capa e túnica) não é perda maior do que perder um zero(capa).
O homem que estabeleceu a paz de Deus em sua alma é um poderoso fator para restabelecer a paz em outros indivíduos e através destes, na sociedade. Os pacificadores serão chamados "filhos de Deus". Deus é paz eterna, infinita, absoluta; não a paz da inércia, fraqueza, vacuidade- mas a paz da dinâmica, da força e da plenitude. Nele não há discórdia, luta, conflito; e quanto mais o homem se aproxima de Deus, pela compreensão e pelo amor, tanto mais a sua vida se assemelha à vida divina pela paz e serenidade. O homem que fez definitivo tratado de paz consigo mesmo, irradia uma atmosfera de calma e felicidade que contagia a todos que forem suficientemente suscetíveis para perceber essas auras pacificantes.
O Sermão da Montanha,páginas 40 a 44(2003)-Editora Martin Claret-Coleção a Obra-Prima de Cada Autor.
Quem é, pois, verdadeiro pacificador?
Não é, em primeiro lugar, aquele que restabelece paz entre as pessoas ou grupos litigantes, mas sim aquele que estabelece e estabiliza a paz dentro de si mesmo. Aliás, ninguém pode ser verdadeiro pacificador de outros, se não for pacificador de si mesmo. Só um autopacificador é que pode ser um alo-pacificador.
Todos os conflitos externos são filhos de algum conflito interno não devidamente pacificado. Por isto, é absurdo querer abolir as guerras ou revoluções de fora, as discórdias domésticas no lar ou no campo de batalha, enquanto o homem não abolir primeiro o conflito dentro da sua própria pessoa.
O grande tratado de paz tem de ser assinado no foro interno do Eu individual antes de poder ser ratificado no foro externo das relações sociais. Nunca haverá Nações Unidas, nunca haverá sociedade ou família unida enquanto não houver indivíduo unido.
A verdadeira paz é um carisma divino, uma graça, uma dádiva de Deus, que é dada a todo o homem que se torna receptivo para receber esse tesouro. A verdadeira paz não pode ser manufaturada pelo ego humano, porque esse ego é o autor de todas as discórdias que existem sobre a face da Terra. Só quando esse pequeno ego humano se integra no grande Eu divino é que pode surgir uma paz duradoura.
Quem tem firme consciência de possuir a plenitude do ser pode facilmente renunciar à abundância do ter. Quanto maior é o ser de uma pessoa, menor é o seu desejo de ter; e, como toda a falta de paz nasce do desejo de ter, e ter cada vez mais, é lógico que o homem que reduziu ao mínimo o seu desejo de ter, não tem motivo para perder a paz.
A paz é, pois, um atributo do ser, é algo qualitativo, algo que tem afinidade com o EU SOU do homem. O homem que tem plena consciência do seu divino EU SOU não tem motivo para brigar ou declarar guerra a alguém por causa dos teres , que desunem os profanos.
Por isto, em vez de brigar por causa da capa que alguém lhe roubou, esse milionário do ser oferece tranqüilamente ao ladrão também a túnica, porque nem a capa e nem a túnica fazem parte do seu ser. E, destarte, ele não sofre perda alguma real: perda dois zeros em vez de um zero, mas a perda de dois zeros(capa e túnica) não é perda maior do que perder um zero(capa).
O homem que estabeleceu a paz de Deus em sua alma é um poderoso fator para restabelecer a paz em outros indivíduos e através destes, na sociedade. Os pacificadores serão chamados "filhos de Deus". Deus é paz eterna, infinita, absoluta; não a paz da inércia, fraqueza, vacuidade- mas a paz da dinâmica, da força e da plenitude. Nele não há discórdia, luta, conflito; e quanto mais o homem se aproxima de Deus, pela compreensão e pelo amor, tanto mais a sua vida se assemelha à vida divina pela paz e serenidade. O homem que fez definitivo tratado de paz consigo mesmo, irradia uma atmosfera de calma e felicidade que contagia a todos que forem suficientemente suscetíveis para perceber essas auras pacificantes.
O Sermão da Montanha,páginas 40 a 44(2003)-Editora Martin Claret-Coleção a Obra-Prima de Cada Autor.
terça-feira, 30 de novembro de 2010
"Bem-aventurados os misericordiosos"
Misericordioso é aquele que tem coração para os míseros; aquele que compreende e ama os fracos, os ignorantes, os doentes, todos os necessitados de corpo, mente e alma, e procura aliviar-lhes os sofrimentos.
Verdade é que o Cristianismo não é, simplesmente, a religião da ética ou caridade;ele é,essencialmente, místico, na sua infinita verticalidade divina mas,também, é certo que ninguém chega a essas alturas místicas da direta experiência de Deus se não se exaurir em caridades éticas para com seus semelhantes; e, depois de atingir as excelsitudes da mística, nunca deixará de manifestar pelo “segundo mandamento” o “primeiro e maior de todos os mandamentos”.
O homem plenamente crístico é dinamicamente solidário.Essa solidariedade dinâmica do homem cristificado não exclui, mas inclui a solidão espiritual do místico.O HOMEM CRÍSTICO É, POR DENTRO, UNICAMENTE DE DEUS, E, POR FORA, DE TODAS AS CREATURAS DE DEUS.
Ninguém pode ser, firme e fecundamente, solidário com os homens se não for, sólida eprofundamente, solitário em Deus. A FRATERNIDADE HUMANA SUPÕE A PATERNIDADE DE DEUS. Não basta “fazer o bem” (dar objetos) — é necessário também “ser bom” (daro sujeito).
O Cristianismo não é uma religião meramente ética, que ensine a fazer o bem —mas é sobretudo, uma religião mística, que exige que o homem seja bom. Fazer o bem é o cumprimento do segundo mandamento, “amarás o teu próximo como a ti mesmo”; ser bom é a atitude do primeiro e maior de todos os mandamentos, “amarás o senhor teu Deus de todo o teu coração, com toda a tua alma, com toda a tua mente e com todas as tuas forças”.
Por isso, os misericordiosos que Jesus proclama bem -aventurados não são apenas pessoas eticamente boas, fazedoras do bem — mas são pessoas misticamente perfeitas,experientes de Deus, e, por isto, essencialmente boas. Esses homens essencialmente perfeitos pelo imediato contato com Deus são também existencialmente bons pela solidariedade com todas as creaturas de Deus. Quem viveu misticamente o Deus do mundo, vive eticamente com todo o mundo de Deus, porquanto a profunda vertical produz necessariamente a vasta horizontal da ética- é esta a grandiosa matemática cósmica da Verdade Libertadora.
Quem espera recompensa, pagamento, pelos benefícios que presta à humanidade é egoísta, mercenário, ainda que essa recompensa consista apenas no desejo de reconhecimento ou gratidão da parte de seus beneficiados.
O beneficiado, é certo, tem a obrigação de ser grato,mas o benfeitor não tem o direito de esperar gratidão! O homem crístico está liberto de qualquer espírito mercenário; trabalha inteiramente de graça, nem espera resultado algum externo de seus trabalhos. Trabalha por amor à sua grande missão, pois sabe que é embaixador plenipotenciário de Deus aqui na terra e em outros mundos.
E é por isso, que ele trabalha com o máximo de perfeição e alegria em tudo, tanto nas coisas grandes como nas coisas pequenas. NUNCA TRABALHA PARA TER PÚBLICO QUE O APLAUDA.Por isso, NÃO O EXALTAM LOUVORES, NEM O DEPRIMEM CENSURAS; É INDIFERENTE A VIVAS E A VAIAS, A APLAUSOS E APUPOS, A BENQUERENÇAS E MALQUERENÇAS porque se libertou definitivamente de todas as escravidões do homem profano, do “homem velho”, e se revestiu da leve e luminosa vestimenta do “homem novo” liberto pela Verdade.
Esse homem vive permanentemente na atmosfera serena e sorridente da “gloriosa liberdade dos filhos de Deus” , cujo diploma crístico vem resumido nas seguintes palavras:
“QUANDO TIVERDES FEITO TUDO O QUE DEVÍEIS FAZER,DIZEI: “SOMOS SERVOS INÚTEIS, CUMPRIMOS APENAS PARA A NOSSA OBRIGAÇÃO, NENHUMA RECOMPENSA MERECEMOS POR ISTO......"
(2003)-Editora Martin Claret-Coleção a Obra-Prima de Cada Autor.
Verdade é que o Cristianismo não é, simplesmente, a religião da ética ou caridade;ele é,essencialmente, místico, na sua infinita verticalidade divina mas,também, é certo que ninguém chega a essas alturas místicas da direta experiência de Deus se não se exaurir em caridades éticas para com seus semelhantes; e, depois de atingir as excelsitudes da mística, nunca deixará de manifestar pelo “segundo mandamento” o “primeiro e maior de todos os mandamentos”.
O homem plenamente crístico é dinamicamente solidário.Essa solidariedade dinâmica do homem cristificado não exclui, mas inclui a solidão espiritual do místico.O HOMEM CRÍSTICO É, POR DENTRO, UNICAMENTE DE DEUS, E, POR FORA, DE TODAS AS CREATURAS DE DEUS.
Ninguém pode ser, firme e fecundamente, solidário com os homens se não for, sólida eprofundamente, solitário em Deus. A FRATERNIDADE HUMANA SUPÕE A PATERNIDADE DE DEUS. Não basta “fazer o bem” (dar objetos) — é necessário também “ser bom” (daro sujeito).
O Cristianismo não é uma religião meramente ética, que ensine a fazer o bem —mas é sobretudo, uma religião mística, que exige que o homem seja bom. Fazer o bem é o cumprimento do segundo mandamento, “amarás o teu próximo como a ti mesmo”; ser bom é a atitude do primeiro e maior de todos os mandamentos, “amarás o senhor teu Deus de todo o teu coração, com toda a tua alma, com toda a tua mente e com todas as tuas forças”.
Por isso, os misericordiosos que Jesus proclama bem -aventurados não são apenas pessoas eticamente boas, fazedoras do bem — mas são pessoas misticamente perfeitas,experientes de Deus, e, por isto, essencialmente boas. Esses homens essencialmente perfeitos pelo imediato contato com Deus são também existencialmente bons pela solidariedade com todas as creaturas de Deus. Quem viveu misticamente o Deus do mundo, vive eticamente com todo o mundo de Deus, porquanto a profunda vertical produz necessariamente a vasta horizontal da ética- é esta a grandiosa matemática cósmica da Verdade Libertadora.
Quem espera recompensa, pagamento, pelos benefícios que presta à humanidade é egoísta, mercenário, ainda que essa recompensa consista apenas no desejo de reconhecimento ou gratidão da parte de seus beneficiados.
O beneficiado, é certo, tem a obrigação de ser grato,mas o benfeitor não tem o direito de esperar gratidão! O homem crístico está liberto de qualquer espírito mercenário; trabalha inteiramente de graça, nem espera resultado algum externo de seus trabalhos. Trabalha por amor à sua grande missão, pois sabe que é embaixador plenipotenciário de Deus aqui na terra e em outros mundos.
E é por isso, que ele trabalha com o máximo de perfeição e alegria em tudo, tanto nas coisas grandes como nas coisas pequenas. NUNCA TRABALHA PARA TER PÚBLICO QUE O APLAUDA.Por isso, NÃO O EXALTAM LOUVORES, NEM O DEPRIMEM CENSURAS; É INDIFERENTE A VIVAS E A VAIAS, A APLAUSOS E APUPOS, A BENQUERENÇAS E MALQUERENÇAS porque se libertou definitivamente de todas as escravidões do homem profano, do “homem velho”, e se revestiu da leve e luminosa vestimenta do “homem novo” liberto pela Verdade.
Esse homem vive permanentemente na atmosfera serena e sorridente da “gloriosa liberdade dos filhos de Deus” , cujo diploma crístico vem resumido nas seguintes palavras:
“QUANDO TIVERDES FEITO TUDO O QUE DEVÍEIS FAZER,DIZEI: “SOMOS SERVOS INÚTEIS, CUMPRIMOS APENAS PARA A NOSSA OBRIGAÇÃO, NENHUMA RECOMPENSA MERECEMOS POR ISTO......"
(2003)-Editora Martin Claret-Coleção a Obra-Prima de Cada Autor.
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
"Bem-aventurados os mansos.."
Indício infalível da verdadeira auto -realização é a mansidão. O homem que encontrou o seu Eu divino é necessariamente manso.
Em que consiste a mansidão?
Consiste na desistência de qualquer violência, física como mental, e sua substituição pela do espírito.Todos os seres que não atingiram a consciência espiritual recorrem à violência paraconseguirem os seus fins. Os irracionais só conhecem violência material.
O homem, depois de intelectualizado, descobriu outro tipo de violência muito mais eficiente, que é a violência mental,violência essa que tem muitos nomes entre os homens; uns lhe chamam astúcia, outros sagacidade, outros ainda política, diplomacia, exploração, etc. No fundo, porém,é invariavelmente o mesmo: são certos argumentos analíticos de que a inteligência se serve para conseguir os seus fins próprios da personalidade do ego.
Quando, porém, o homem avança notavelmente no caminho da sua evolução superior,compreende ele que toda a violência física e mental, sem excetuar a mais alta magia mental,é sinal de fraqueza. Quando o homem descobre em si as potências divinas, desiste definitivamente de toda e qualquer espécie de violência física e mental. Não mais confia em máquinas e aparelhos materiais manobrados pela força do intelecto.
O homem auto-realizado descobriu a essência de si mesmo e de todas as coisas,essência essa que é imaterial, e por isso não mais o interessam as aparências periféricas, que os profanos consideram realidades.Por isto, não há para o homem manso de coração motivo algum para recorrer à fraquezada violência brutal, quando ele possui a força da suavidade e benevolência espiritual.
O espírito da força será substituído pela força do espírito.
As conquistas feitas pela irresistível suavidade do espírito da mansidão e do amor, como as de Jesus Cristo, de Francisco de Assis, de Mahatma Gandhi e outros continuam em milhares e milhões de almas humanas.
As coisas suaves têm duração garantida, embora a sua atuação inicial seja, quase sempre, lenta e quase imperceptível. É fato multimilenar que os homens que mais realizam em si a força do espírito do que o espírito da força são credores do amor, da simpatia e entusiástica dedicação dos melhores dentre os filhos dos homens. Esta sabedoria cósmica que proclama a posse do mundo e dos homens pela suavidade do amor e da benevolência, pela não-violência e não agressividade, é privilégio de poucos homens da atual geração.
Essa promessa de Jesus, de que os mansos possuirão a Terra, parece tão estranhamente parodoxal e contrária a todas nossas experiências, que julgamos necessário investigar um pouco mais o conceito de "possuir". O verdadeiro "possuidor" não é um ato físico, material, mas uma atitude metafísica, espiritual. O verdadeiro "possuidor" é do mundo do ser interno, e não do mundo do ter externo.
Ninguém pode possuir algo ou alguém enquanto esse algo ou alguém não concorda em ser possuído; mas, a partir do momento em que consente ser possuído, o possuidor o possui realmente, porque também o possuído se tornou um possuidor, e há igualdade de posse de parte a parte.
Só se pode possuir algo ou alguém pelo amor mútuo, bilateral, espontâneo, quando ao "sim" de um responde o "sim" do outro.
Compreendemos facilmente que uma pessoa possa sintonizar as suas vibrações pela frequência vibratória de outra pessoa- mas dificilmente admitimos que uma coisa inanimada e inconsciente, como a terra ou a natureza, possam sintonizar a sua vibração com a do homem. Poderá ela concordar ou discordar em ser por ele possuída ou não?
Aqui é que está um dos velhos erros do homem profano de todos os tempos e de todas as idades: pensar que a natureza infra-humana, falsamente chamada de insconsciente, não sinta as auras irradiadas pelo homem. Como se a natureza fosse uma massa morta, e não uma presença viva!...
Toda a vida de São Francisco de Assis é uma afirmação permanente de que a natureza não é inconsciente e que compreende a linguagem do homem, quando esta deixa o plano teórico da análise mental e passa para a misteriosa zona vital ou espiritual.
Não é fácil ao homem comum, atingir os pináculos da suprema racionalidade pela ladeira íngrime da metafísica, e poucos conseguem escalar o "Himalaia" por esse lado; mas é fácil ascender ao mais alto "Everest" da suprema racionalidade pelo caminho do amor.
Amar incondicionalmente, é o caminho mais curto e rápido às alturas da compreensão integral e universal.
O Sermão da Montanha,Páginas 26 a 32
Em que consiste a mansidão?
Consiste na desistência de qualquer violência, física como mental, e sua substituição pela do espírito.Todos os seres que não atingiram a consciência espiritual recorrem à violência paraconseguirem os seus fins. Os irracionais só conhecem violência material.
O homem, depois de intelectualizado, descobriu outro tipo de violência muito mais eficiente, que é a violência mental,violência essa que tem muitos nomes entre os homens; uns lhe chamam astúcia, outros sagacidade, outros ainda política, diplomacia, exploração, etc. No fundo, porém,é invariavelmente o mesmo: são certos argumentos analíticos de que a inteligência se serve para conseguir os seus fins próprios da personalidade do ego.
Quando, porém, o homem avança notavelmente no caminho da sua evolução superior,compreende ele que toda a violência física e mental, sem excetuar a mais alta magia mental,é sinal de fraqueza. Quando o homem descobre em si as potências divinas, desiste definitivamente de toda e qualquer espécie de violência física e mental. Não mais confia em máquinas e aparelhos materiais manobrados pela força do intelecto.
O homem auto-realizado descobriu a essência de si mesmo e de todas as coisas,essência essa que é imaterial, e por isso não mais o interessam as aparências periféricas, que os profanos consideram realidades.Por isto, não há para o homem manso de coração motivo algum para recorrer à fraquezada violência brutal, quando ele possui a força da suavidade e benevolência espiritual.
O espírito da força será substituído pela força do espírito.
As conquistas feitas pela irresistível suavidade do espírito da mansidão e do amor, como as de Jesus Cristo, de Francisco de Assis, de Mahatma Gandhi e outros continuam em milhares e milhões de almas humanas.
As coisas suaves têm duração garantida, embora a sua atuação inicial seja, quase sempre, lenta e quase imperceptível. É fato multimilenar que os homens que mais realizam em si a força do espírito do que o espírito da força são credores do amor, da simpatia e entusiástica dedicação dos melhores dentre os filhos dos homens. Esta sabedoria cósmica que proclama a posse do mundo e dos homens pela suavidade do amor e da benevolência, pela não-violência e não agressividade, é privilégio de poucos homens da atual geração.
Essa promessa de Jesus, de que os mansos possuirão a Terra, parece tão estranhamente parodoxal e contrária a todas nossas experiências, que julgamos necessário investigar um pouco mais o conceito de "possuir". O verdadeiro "possuidor" não é um ato físico, material, mas uma atitude metafísica, espiritual. O verdadeiro "possuidor" é do mundo do ser interno, e não do mundo do ter externo.
Ninguém pode possuir algo ou alguém enquanto esse algo ou alguém não concorda em ser possuído; mas, a partir do momento em que consente ser possuído, o possuidor o possui realmente, porque também o possuído se tornou um possuidor, e há igualdade de posse de parte a parte.
Só se pode possuir algo ou alguém pelo amor mútuo, bilateral, espontâneo, quando ao "sim" de um responde o "sim" do outro.
Compreendemos facilmente que uma pessoa possa sintonizar as suas vibrações pela frequência vibratória de outra pessoa- mas dificilmente admitimos que uma coisa inanimada e inconsciente, como a terra ou a natureza, possam sintonizar a sua vibração com a do homem. Poderá ela concordar ou discordar em ser por ele possuída ou não?
Aqui é que está um dos velhos erros do homem profano de todos os tempos e de todas as idades: pensar que a natureza infra-humana, falsamente chamada de insconsciente, não sinta as auras irradiadas pelo homem. Como se a natureza fosse uma massa morta, e não uma presença viva!...
Toda a vida de São Francisco de Assis é uma afirmação permanente de que a natureza não é inconsciente e que compreende a linguagem do homem, quando esta deixa o plano teórico da análise mental e passa para a misteriosa zona vital ou espiritual.
Não é fácil ao homem comum, atingir os pináculos da suprema racionalidade pela ladeira íngrime da metafísica, e poucos conseguem escalar o "Himalaia" por esse lado; mas é fácil ascender ao mais alto "Everest" da suprema racionalidade pelo caminho do amor.
Amar incondicionalmente, é o caminho mais curto e rápido às alturas da compreensão integral e universal.
O Sermão da Montanha,Páginas 26 a 32
"Bem-aventurados os puros de coração"
“Puro de coração” é aquele que se libertou, não só dos objetos externos, mas, também,do sujeito interno, isto é, daquilo que ele idolatrava como sendo o seu sujeito, o seu eu, embora fosse apenas o seu pseudo-eu, o seu pequeno ego físico-mental.
Quem se libertou dos bens materiais fora dele possui o “reino dos céus” , porque o seu reino já não é deste mundo; rejeitou a oferta do ego luciférico “eu te darei todos os reinos do mundo e sua glória” - mas quem se libertou, também, do maior pseudo bem dentro dele, o seu idolatrado ego personal, esse tem a certeza de “ver a Deus”, verá o verdadeiro Deus, porque olha para além do seu falso eu.
De maneira que ser puro de coração é ainda mais glorioso do que ser pobre pelo espírito; ser interiormente livre da obsessão do ego vivo é mais do que ser livre da escravidão da matéria morta.
Aliás, ninguém pode ser realmente livre da matéria morta dos bens externos sem ser livre da ilusão do ego vivo, porque tudo que eu chamo “meu” é apenas um reflexo e uma conseqüência do meu falso “eu”, o ego físico -mental; se o meu falso eu se tivesse integrado no verdadeiro Eu, que é o Universo em mim, não teria eu necessidade alguma de me apegar àquilo que chamo “meu”, os bens individuais.
O egoísta impuro não pode ver a Deus, que é amor puríssimo.
O egoísmo, portanto, a egolatria, equivale a uma cegueira mental. Entre o Deus -amor e o homem egoísta se ergue,por assim dizer uma muralha opaca que intercepta a luz divina. Enquanto o homem não ultrapassar as estreitas barreiras do seu ego personal, está com o s olhos vendados, separados de Deus por uma camada impermeável à luz, que é a impureza do coração.
Por mais que um ególatra ouça falar em Deus, nada compreende, porque com preender supõe ser. Ninguém pode compreender senão aquilo que ele vive ou é no seu íntimo ser.
Entender é um ato mental,mas compreender é uma atitude vital; entender mentalmente é uma função parcial, unilateral do nosso ego humano — compreender é uma vivência total, unilateral, do nosso Eu divino.Quem não é divino não pode saber o que é Deus.
Se é difícil a "pobreza pelo espírito", muito mais difícil é a "pureza de coração". O desapego dos bens externos é o abandono de algo que não fez, nem jamais poderá fazer parte integrante do homem, algo que nunca foi nem pode ser realmente "seu"- ao passo que o ego personal faz parte integrante do homem, é "seu", embora não seja ele mesmo; e por isto a renúncia à sua personalidade físico-mental em prol da sua individualidade espiritual é comparavelmente mais difícil do que a renúncia à cobiça dos bens externos.
O despertar dessa nova vidência, que existe, dormente, em cada um de nós, requer exercício intenso, assíduo e prolongado, porque o homem tem de superar barreiras já estabilizadas há séculos e milênios. Esse exercício diário e vital consiste, principalmente, numa permanente atitude interna de querer servir, servir espontânea e gratuitamente a todos.
Esse clima de querer servir, espontânea e gratuitamente, remove os obstáculos que existem entre nós e o Todo(Deus), porque diminui gradualmente o egoísmo unilateral e exclusivista e aumenta a solidariedade uniliteral e inclusivista, que uns chamam altruísmo, outros amor, outros ainda benevolência universal.
O Sermão da Montanha,páginas de 22 a 25
Quem se libertou dos bens materiais fora dele possui o “reino dos céus” , porque o seu reino já não é deste mundo; rejeitou a oferta do ego luciférico “eu te darei todos os reinos do mundo e sua glória” - mas quem se libertou, também, do maior pseudo bem dentro dele, o seu idolatrado ego personal, esse tem a certeza de “ver a Deus”, verá o verdadeiro Deus, porque olha para além do seu falso eu.
De maneira que ser puro de coração é ainda mais glorioso do que ser pobre pelo espírito; ser interiormente livre da obsessão do ego vivo é mais do que ser livre da escravidão da matéria morta.
Aliás, ninguém pode ser realmente livre da matéria morta dos bens externos sem ser livre da ilusão do ego vivo, porque tudo que eu chamo “meu” é apenas um reflexo e uma conseqüência do meu falso “eu”, o ego físico -mental; se o meu falso eu se tivesse integrado no verdadeiro Eu, que é o Universo em mim, não teria eu necessidade alguma de me apegar àquilo que chamo “meu”, os bens individuais.
O egoísta impuro não pode ver a Deus, que é amor puríssimo.
O egoísmo, portanto, a egolatria, equivale a uma cegueira mental. Entre o Deus -amor e o homem egoísta se ergue,por assim dizer uma muralha opaca que intercepta a luz divina. Enquanto o homem não ultrapassar as estreitas barreiras do seu ego personal, está com o s olhos vendados, separados de Deus por uma camada impermeável à luz, que é a impureza do coração.
Por mais que um ególatra ouça falar em Deus, nada compreende, porque com preender supõe ser. Ninguém pode compreender senão aquilo que ele vive ou é no seu íntimo ser.
Entender é um ato mental,mas compreender é uma atitude vital; entender mentalmente é uma função parcial, unilateral do nosso ego humano — compreender é uma vivência total, unilateral, do nosso Eu divino.Quem não é divino não pode saber o que é Deus.
Se é difícil a "pobreza pelo espírito", muito mais difícil é a "pureza de coração". O desapego dos bens externos é o abandono de algo que não fez, nem jamais poderá fazer parte integrante do homem, algo que nunca foi nem pode ser realmente "seu"- ao passo que o ego personal faz parte integrante do homem, é "seu", embora não seja ele mesmo; e por isto a renúncia à sua personalidade físico-mental em prol da sua individualidade espiritual é comparavelmente mais difícil do que a renúncia à cobiça dos bens externos.
O despertar dessa nova vidência, que existe, dormente, em cada um de nós, requer exercício intenso, assíduo e prolongado, porque o homem tem de superar barreiras já estabilizadas há séculos e milênios. Esse exercício diário e vital consiste, principalmente, numa permanente atitude interna de querer servir, servir espontânea e gratuitamente a todos.
Esse clima de querer servir, espontânea e gratuitamente, remove os obstáculos que existem entre nós e o Todo(Deus), porque diminui gradualmente o egoísmo unilateral e exclusivista e aumenta a solidariedade uniliteral e inclusivista, que uns chamam altruísmo, outros amor, outros ainda benevolência universal.
O Sermão da Montanha,páginas de 22 a 25
domingo, 28 de novembro de 2010
"Bem-aventurados os pobres pelo espírito!"
Poucas palavras do Evangelho sofreram, através dos séculos, tão grande adulteração e ludíbrio tamanho como estes. Escritores e oradores de fama mundial, e até ministros do Evangelho, aderem à blasfêmia de que o Nazareno tenha proclamado bem -aventurados e cidadãos do reino dos céus os "pobres de espírito", isto é, os apoucados de inteligência, os idiotas e imbecis, os mentalmente medíocres.
Se assim fosse, o próprio Nazareno, riquíssimo de espírito, não faria parte dos bem -aventurados e possuidores do reino dos céus.Nem no texto grego do primeiro século, nem na tradução latina da Vulgata se encontre o tópico "pobres de espírito", mas sim "pobres pelo espírito", ou seja, "pobres segundo o espírito"(em grego: tô pneu mati, no terceiro caso, dativo, não no segundo, genitivo; em latim: spiritu, no sexto caso, ablativo não no genitivo).
Na tradução "de espírito" entende -se o genitivo, como se disséssemos: "fulano é pobre de saúde, de inteligência", isto é, falta -lhe saúde, inteligência. De maneira que nem a gramática nem o espírito geral do Nazareno permitem a tradução "pobres de espírito", que, no entanto, se tornou abuso quase universal.
Jesus proclama bem-aventurados, cidadãos do reino dos céus, agora e aqui mesmo,todos aqueles que são pobres, ou desapegados, dos bens terrenos, não pela força compulsória das circunstâncias externas e fortuitas, mas sim pela livre e espontânea escolha espiritual; os que, podendo possuir bens materiais, resolveram livremente despossuir -se deles, por amor aos bens espirituais, fiéis ao espírito do Cristo: "Não acumuleis para vós bens na terra — mas acumulai bens nos céus".
O verdadeiro abandono, porém, não consiste em uma fuga ou deserção externa, massim em uma libertação interna. Pode o milionário possuir externamen-te os seus milhões, e estar internamente liberto deles — e pode, também, o mendigo não possuir bens materiais e,no entanto, viver escravizado pelo desejo de os possuir, e, neste caso, é ele escravo daquilo que não possui, assim como o milionário pode ser livre daquilo que possui. Este possui sem ser possuído — aquele é possuído pelo que não possui.
O que decide não é possuir ou não possuir externamente-o principal é saber possuir ou não possuir. Ser rico ou ser pobre são coisas que nos acontecem, de fora-mas a arte de saber ser rico ou de ser pobre, é algo que nós produzimos, de dentro.
A verdadeira liberdade, ou seu contrário, consiste numa atitude do sujeito, e não sem simples fatos dos objetos. Ser rico não é pecado- ser pobre não é virtude.
Naturalmente, quem é incapaz de se libertar internamente do apego aos bens materiais sem os abandonar, também, externamente, esse deve ter a coragem e sinceridade consigo mesmo de se despossuir deles, também, no plano objetivo, a fim de conseguir a "pobreza pelo espírito",isto é, a libertação interior. Aquele jovem rico do Evangelho, ao que parece, era incapaz de possuir sem ser possuído; por isso, o divino Mestre lhe recomendou que se despossuísse de tudo a fim de não ser possuído de nada — mas ele falhou. E por isso se retirou, triste e pesaroso, "porque era possuidor de muitos bens". Possuidor? não — era possuído de muitos bens.
Quem fez dos bens materiais um fim, em vez de um meio, pratica idolatria, porque"ninguém pode servir a dois senhores, a Deus e ao dinheiro". Quem serve é servo, escravo,inferior. Quem serve ao dinheiro proclama o dinheiro seu senhor e soberano e a si mesmo servo e súdito. Mas quem obriga o dinheiro a servir -lhe é senhor do mesmo, porque usa o dinheiro como meio para algum fim superior.
Bem-aventurados os pobres pelo espírito, os que, pela força do espírito, se emanciparamda escravidão da matéria. Deles é o reino dos céus, agora, aqui, e para sempre e por toda a parte, porque, sendo que o reino dos céus está dentro do homem, esse homem leva consigo o reino da sua felicidade aonde quer que vá...
O nosso pequeno ego humano é muito fraco, e necessita de ser escorado por muitosbens materiais para se sentir um pouco mais forte e seguro mas o nosso Eu divino é tão forte que pode dispensar essas escoras e muletas externas e sentir-se perfeitamente seguro pela força interna do espírito.
Bem - aventurado esse pobre do ego- e esse rico do Eu...
O Sermão da Montanha,páginas 19 a 21
Se assim fosse, o próprio Nazareno, riquíssimo de espírito, não faria parte dos bem -aventurados e possuidores do reino dos céus.Nem no texto grego do primeiro século, nem na tradução latina da Vulgata se encontre o tópico "pobres de espírito", mas sim "pobres pelo espírito", ou seja, "pobres segundo o espírito"(em grego: tô pneu mati, no terceiro caso, dativo, não no segundo, genitivo; em latim: spiritu, no sexto caso, ablativo não no genitivo).
Na tradução "de espírito" entende -se o genitivo, como se disséssemos: "fulano é pobre de saúde, de inteligência", isto é, falta -lhe saúde, inteligência. De maneira que nem a gramática nem o espírito geral do Nazareno permitem a tradução "pobres de espírito", que, no entanto, se tornou abuso quase universal.
Jesus proclama bem-aventurados, cidadãos do reino dos céus, agora e aqui mesmo,todos aqueles que são pobres, ou desapegados, dos bens terrenos, não pela força compulsória das circunstâncias externas e fortuitas, mas sim pela livre e espontânea escolha espiritual; os que, podendo possuir bens materiais, resolveram livremente despossuir -se deles, por amor aos bens espirituais, fiéis ao espírito do Cristo: "Não acumuleis para vós bens na terra — mas acumulai bens nos céus".
O verdadeiro abandono, porém, não consiste em uma fuga ou deserção externa, massim em uma libertação interna. Pode o milionário possuir externamen-te os seus milhões, e estar internamente liberto deles — e pode, também, o mendigo não possuir bens materiais e,no entanto, viver escravizado pelo desejo de os possuir, e, neste caso, é ele escravo daquilo que não possui, assim como o milionário pode ser livre daquilo que possui. Este possui sem ser possuído — aquele é possuído pelo que não possui.
O que decide não é possuir ou não possuir externamente-o principal é saber possuir ou não possuir. Ser rico ou ser pobre são coisas que nos acontecem, de fora-mas a arte de saber ser rico ou de ser pobre, é algo que nós produzimos, de dentro.
A verdadeira liberdade, ou seu contrário, consiste numa atitude do sujeito, e não sem simples fatos dos objetos. Ser rico não é pecado- ser pobre não é virtude.
Naturalmente, quem é incapaz de se libertar internamente do apego aos bens materiais sem os abandonar, também, externamente, esse deve ter a coragem e sinceridade consigo mesmo de se despossuir deles, também, no plano objetivo, a fim de conseguir a "pobreza pelo espírito",isto é, a libertação interior. Aquele jovem rico do Evangelho, ao que parece, era incapaz de possuir sem ser possuído; por isso, o divino Mestre lhe recomendou que se despossuísse de tudo a fim de não ser possuído de nada — mas ele falhou. E por isso se retirou, triste e pesaroso, "porque era possuidor de muitos bens". Possuidor? não — era possuído de muitos bens.
Quem fez dos bens materiais um fim, em vez de um meio, pratica idolatria, porque"ninguém pode servir a dois senhores, a Deus e ao dinheiro". Quem serve é servo, escravo,inferior. Quem serve ao dinheiro proclama o dinheiro seu senhor e soberano e a si mesmo servo e súdito. Mas quem obriga o dinheiro a servir -lhe é senhor do mesmo, porque usa o dinheiro como meio para algum fim superior.
Bem-aventurados os pobres pelo espírito, os que, pela força do espírito, se emanciparamda escravidão da matéria. Deles é o reino dos céus, agora, aqui, e para sempre e por toda a parte, porque, sendo que o reino dos céus está dentro do homem, esse homem leva consigo o reino da sua felicidade aonde quer que vá...
O nosso pequeno ego humano é muito fraco, e necessita de ser escorado por muitosbens materiais para se sentir um pouco mais forte e seguro mas o nosso Eu divino é tão forte que pode dispensar essas escoras e muletas externas e sentir-se perfeitamente seguro pela força interna do espírito.
Bem - aventurado esse pobre do ego- e esse rico do Eu...
O Sermão da Montanha,páginas 19 a 21
sábado, 6 de novembro de 2010
o Paradoxo Místico-Político
A humanidade conhece alguns místicos e muitos políticos - mas um místico político, ou um político místico, isto é coisa assaz estranha e, à primeira vista, impossível. O místico trata das coisas de Deus e do mundo espiritual; o político interessa-se pelas coisas dos homens e deste mundo material- será possível que, dentro do mesmo indivíduo humano, se coadunem esses dois mundos, tão distantes e, aparentemente, tão antagônicos?
Se o monismo cósmico não fosse um postulado da lógica; se não compreendêssemos que só pode haver um único princípio eterno de todas as coisas, sejam elas da zona material, sejam da zona espiritual - e estaríamos dispostos a professar dualismo zoroastriano e negar a compatibilidade de elementos tão incompatíveis como a mística e a política.
De longe em longe, porém aparece um homem de vastíssimos espaços internos, onde todo um sistema planetário pode girar livremente, sem colisões nem catástrofes, em torno de um único sol, que tudo ilumina e vitaliza. No interior desse sistema se forma, naturalmente, uma tensão dinâmica que, para manter o equilíbrio, tem de intensificar a sua força centrípeta na razão direta da sua força centrífuga, a fim de estabelecer um cosmos que não sucumba ao caos.
De vez em quando aparece, aqui na Terra, um homem cósmico dessa natureza, um homem que equilibra extremos e sintetiza antíteses aparentemente inconciliáveis. A grandeza de Mahatma Gandhi não está em ter sido um grande místico, nem em ter sido um hábil político - está em ter equilibrado em sua alma dois mundos
quase sempre desequilibrados em outros homens.No homem comum, de estreitos espaços internos, não pode, de fato, haver amizade e harmonia entre o Deus do mundo e o mundo de Deus.
Desde tempos imemoriais tem havido místicos, desertores do mundo que encontraram a sua perfeição e felicidade na silenciosa solidão com Deus,em alguma caverna desnuda, na vastidão duma floresta, no cume duma montanha, no sugestivo silêncio dum deserto - ou então por detrás dos muros de um convento ou mosteiro. Disto temos milhares de exemplos.
Por outro lado, existem homens dinâmicos, peritos em lidar com dinheiro,mestres em política e diplomacia, relações nacionais e internacionais,homens que, depois de mortos, costumam ter estátuas de bronze ou de mármore em praça pública e cujas biografias enchem as prateleiras das bibliotecas. A política parece ser essencialmente dativa, vale pelo que dá ou realiza. A mística parece ser essencialmente receptiva, vale pelo que recebe e pelo que é. Aquela é considerada ativa - esta tem fama de ser passiva; mas são dois enganos, porque nem o político é ativo, nem o místico é passivo. Ambos são dativos-receptivos, ambos ativos-passivos.
A diferença está apenas no maior ou menor grau de datividade ativa e de receptividade passiva. No político é, geralmente, máxima a atividade dativa, ao ponto de esterilizar a sua passividade receptiva - e isto é a desgraça dele! No místico isolacionista é máxima a passividade receptiva e mínima a atividade dativa. Ser dinamicamente passivo, ou passivamente dinâmico - eis o problema central da vida humana, o segredo último da sua grandeza e felicidade e a fonte suprema da sua força realizadora no seio da humanidade.
O homem medíocre, unilateralmente ativo, vive na alucinação coletiva de que é ele mesmo, seu conhecido ego humano, quem realiza grandes coisas no mundo; que é a sua inteligência e astúcia, o seu dinheiro, o seu jeito, a sua erudição, a sua incessante lufa-lufa social, comercial,industrial, política, diplomática, que estes fatores sejam a causa real e última das coisas que ele realiza ou tenta realizar sobre a face da terra.
E se alguém lhe disser que, por detrás de todos esses elementos ponderáveis e palpáveis da sua ruidosa atividade, há um elemento imponderável e intangível que, em última análise, é a fonte inicial e profunda de tudo quanto de realmente grande acontece em sua vida - então esse homem dinâmico meneia a cabeça, incrédulo, e considera poeta, filósofo ou místico, ou pelo menos imprático, o homem que tão estranhas coisas pro fere.
Esse homem ignora o que seja passividade dinâmica serenidade creadora. Não tem consciência do imenso reservatório de forças cósmicas, esse invisível oceano que se alarga, incomensurável,misterioso infinito, para além de todos os horizontes da percepção físico-mental. Para ele só existem os pequeninos arroios e regatos que imanam do seu conhecido ego,correndo não se sabe para onde. Esse homem medíocre e míope nem sequer suspeita que esses próprios arroios e regatos da sua atividade febril vão para o silencioso mar, donde vieram.
Gandhi era duma vasta atividade e duma profunda passividade, e tudo que ele dava a seus semelhantes, na horizontal, recebera-o de Deus, na vertical. Por isso, a hora diária de meditação, primeira hora do dia, e a segunda-feira toda, primeiro dia útil da semana, eram para ele a coisa mais importante, porque eram as silenciosas nascentes da sua passividade dinâmica que alimentavam os ruidosos rios da sua incessante atividade.
O povo deu a Mohandas Karamchand Gandhi o nome de "mahatma", isto é,"grande alma", porque sentia intuitivamente que, para além do cenário das suas visíveis realizações humanas, havia misteriosas regiões de invisíveis realidades divinas - e a sua grandeza estava precisamente na constante ligação do seu mundo visível com o mundo invisível: toda a sua política externa assentava alicerces na sua mística interna.
É fácil trabalhar no mundo visível - o grosso da humanidade profana vive unicamente nesse plano. Mais difícil é contemplar o mundo invisível, longe de todos os mundos visíveis - há um grupo de avançados ascetas místicos que vivem nesse mundo ignoto.Dificílimo é viver de tal modo no mundo invisível que todos os mundos visíveis da nossa vida sejam permeados e vitalizados pela luz desse universo espiritual, e todas as materialidades da existência terrestre sejam como que aureoladas de um halo de poesia e beleza, nascido dessa inefável experiência do reino de Deus em nós.
Muitos são os impuros no meio dos impuros. Poucos vivem puros no meio dos puros. Pouquíssimos conseguem viver puros no meio dos impuros. Esses últimos são os verdadeiros "mahatmas",as grandes almas, os homens cósmicos, plenamente realizados. O supremo alvo do Evangelho do Cristo é a creação desses homens, dessas "novas creaturas em Cristo".
A Índia foi sempre o país clássico dos yoguis, dos ascetas, dos místicos, dos mestres da renúncia e espiritualidade. Gandhi também fundou o seu ashram, ou colônia de retiro espiritual. Era uma espécie de
fazenda onde moravam numerosas pessoas de vida disciplinada e sem propriedade individual. Concentração mental e contemplação espiritual durante a madrugada; abstenção de carne e bebidas alcoólicas; trabalhos manuais e agrícolas; reuniões cultuais - tudo isto se observara no ashram de Gandhi, e ele mesmo era uma espécie de patriarca dessa comunidade.
Até aqui, nada de especial; tudo isto se praticava, havia séculos e milênios, na Índia. Acontece, porém, que esse místico solitário aparece em palácios de reis e chefes de estados, nas grandes cortes européias;toma parte em debates políticos, em torno de problemas nacionais e internacionais; agita questões de grande relevância; porque esse homem é um hábil jurista, formado pela Universidade de Londres, que conhece e usa toda a dialética dos advogados e possui toda a perspicácia dos grandes estadistas.
E no seu próprio país, aparece no Congresso Nacional e pleiteia, contra um poderoso império, a emancipação política de 430 milhões de conterrâneos escravizados; mas não usa de nenhuma das armas materiais de que seus antagonistas se servem. Substituiu a arma pela alma. Esse homem não acumula dinheiro para si; vive em extrema pobreza e simplicidade, nutrindo-se de umas poucas frutas e do leite cru duma cabra, que nem era dele.
Veste um calção e anda descalço, ou de sandálias, mesmo nos salões dos magnatas europeus, que o apelidam jocosamente de "faquir seminu". Pelas mãos desse homem estranho, tão solitário com Deus quão solidário com os homens passam anualmente muitos milhões - mas ele mesmo não possui casa nem terreno e gasta apenas uns centavos por dia para sua manutenção.
Cercado da mais imunda 'política e diplomacia internacional, por espaço de meio século, esse homem não se desvia, por um triz, da sua linha de absoluta verdade e sinceridade; não admite manobras escusas à meia-luz;não conhece jogo bifronte por detrás dos bastidores. Defensor máximo da liberdade de seu povo, admite uma única tirania para si mesmo, a obediência incondicional à "voz silenciosa do interior" (the still small voice), como ele chama a voz da consciência.
O enigma Mahatma Gandhi tão diáfano como a luz solar - e tão misterioso como uma noite estrelada. Sempre solitário em Deus, nunca deixa de ser solidário com os homens.
Com o fenômeno Gandhi entrou a história da humanidade numa nova fase de evolução. Está provado, finalmente, que são compatíveis essas duas coisas tidas por incompatíveis, a mais intensa mística interior e a mais extensa dinâmica exterior, o Deus do mundo e o mundo de Deus. Esse homem realizou na sua vida a grande síntese do espírito e da matéria, do fogo e da água. Nele o Verbo se fez carne e habita em nós. Daqui por diante,o materialista não tem mais justificativa para sua falta de espiritualidade - e o espiritualista não tem mais o direito de desertar do mundo material. Foi realizada a grande síntese, e o que foi possível uma vez na Índia é possível sempre e por toda a parte. O Mahatma não é da Índia,nem do Oriente - ele é do mundo e da humanidade.
Na Idade Média, quando um homem tinha tido o seu contato com Deus, o primeiro passo consistia em se libertar de vez de todas as coisas do mundo; abandonava o mundo de Deus a fim de viver em Deus fora do mundo.O ponto culminante da vida ascética era a deserção do mundo.Com Gandhi aparece uma nova forma de ascese - a ascese da libertação,substituindo e aperfeiçoando a ascese da deserção. Quem deserta das coisas materiais mostra boa vontade - mas não prova verdadeira compreensão. Por que foge? Por que deserta? Porque se sente fraco e receia cair; mas o temor é escravizante.
Plenamente liberto e livre é somente o homem que, depois de se consolidar definitivamente no mundo espiritual, volta ao mundo material sem se materializar; o seu reino não é daqui, mas ele ainda trabalha aqui, como se fosse o mais profano dos profanos. Somente um homem plenamente espiritual pode admitir aparências de materialidade sem desmentir a sua espiritualidade.
De um homem que nada espera do mundo, tudo pode o mundo esperar. Mas há, para além do homem dinamicamente ativo e do homem estaticamente passivo, uma terceira alternativa, que é o homem dinamicamente passivo ou passivamente dinâmico. Com esta qualificação designamos o homem cósmico, esse homem raríssimo que, depois de se identificar totalmente com o seu centro real, com o seu Eu divino, passa a manifestar esta sua implosão mística numa vasta explosão ética, transbordando a sua experiência divina em vivência humana.
Uma vez que o homem atingiu a consciência da paternidade única de Deus, está em condições de realizar a vivência da fraternidade universal dos homens. E, neste caso,a ética não é apenas moralidade, que pode existir mesmo sem a experiência mística; mas o seu agir externo será o espontâneo transbordamento,a irresistível explosão da sua intensa implosão mística.
Quando, um dia, alguém sugeriu a Gandhi a idéia de abandonar o mundo profano da política e retirar-se a uma caverna para viver como, místico,respondeu ele: "Eu trago essa caverna dentro de mim." Quem consegue transferir a "caverna" externa dos místicos para o seu interior,refugiando-se a esse santuário quando sente necessidade, esse atingiu a culminância da sua libertação, a "gloriosa liberdade dos filhos de Deus". Mas, para que alguém atinja essa liberdade deve sujeitar-se voluntariamente à maior das tiranias, à sacrossanta "tirania da silenciosa voz do interior", e prestar obediência incondicional ao divino ditador da consciência. É este o "caminho estreito e a porta apertada que conduzem ao reino de Deus". De maneira que a mais ampla liberdade supõe a mais completa tirania - tirania voluntária.
"A Verdade - escreve- Gandhi -- é dura como diamante, mas é também delicada como flor de pessegueiro." Quem não aceita voluntariamente a dureza diamantina da Verdade, não chegará a fruir a sua delicadeza de flor de pessegueiro. Plenamente livre é somente aquele que voluntariamente se escraviza. E essa espontânea escravidão se refere não somente a Deus, refere-se também aos homens, nossos semelhantes; servir voluntariamente é libertar-se totalmente. Nada mais escravizante do que o desejo de querer-ser-servido - nada mais libertador do que a vontade de querer-servir!
Quem não for escravo voluntário não pode ser homem livre - esse estranho paradoxo caracteriza a vida toda de Gandhi. Tão grande é a liberdade interior desse homem que ele se torna,exteriormente, escravo de seus conterrâneos, escravo do invasor britânico, escravo da humanidade inteira.
Quem não se sente plenamente livre deve evitar servir aos outros e deve assumir ares de dominador, porque onde falta a essência têm de prevalecer as aparências. Mas quem traz dentro de si o testemunho da sua liberdade real, esse pode ser servidor de todos, porque a sua firme liberdade não necessita de ser escorada com pseudo-liberdades. Quem é sábio pode serenamente admitir aparências de tolo; mas o tolo tem de evitar solicitamente essas aparências e assumir ares de sábio, para que a sua pseudo-sapiência não sucumba ao impacto da sua insipiência.
O mundo de hoje não compreendeu ainda a verdadeira grandeza de Gandhi,sem dúvida um dos mais lídimos discípulos que o Nazareno teve entre os homens, nesses quase dois milênios de era cristã. Mas o espírito do Mahatma está trabalhando as consciências humanas, qual divino fermento,levedando aos poucos a massa profana e preparando o caminho para a grande alvorada crística.
Do livro Mahatma Gandhi,páginas de 11 a 24
Se o monismo cósmico não fosse um postulado da lógica; se não compreendêssemos que só pode haver um único princípio eterno de todas as coisas, sejam elas da zona material, sejam da zona espiritual - e estaríamos dispostos a professar dualismo zoroastriano e negar a compatibilidade de elementos tão incompatíveis como a mística e a política.
De longe em longe, porém aparece um homem de vastíssimos espaços internos, onde todo um sistema planetário pode girar livremente, sem colisões nem catástrofes, em torno de um único sol, que tudo ilumina e vitaliza. No interior desse sistema se forma, naturalmente, uma tensão dinâmica que, para manter o equilíbrio, tem de intensificar a sua força centrípeta na razão direta da sua força centrífuga, a fim de estabelecer um cosmos que não sucumba ao caos.
De vez em quando aparece, aqui na Terra, um homem cósmico dessa natureza, um homem que equilibra extremos e sintetiza antíteses aparentemente inconciliáveis. A grandeza de Mahatma Gandhi não está em ter sido um grande místico, nem em ter sido um hábil político - está em ter equilibrado em sua alma dois mundos
quase sempre desequilibrados em outros homens.No homem comum, de estreitos espaços internos, não pode, de fato, haver amizade e harmonia entre o Deus do mundo e o mundo de Deus.
Desde tempos imemoriais tem havido místicos, desertores do mundo que encontraram a sua perfeição e felicidade na silenciosa solidão com Deus,em alguma caverna desnuda, na vastidão duma floresta, no cume duma montanha, no sugestivo silêncio dum deserto - ou então por detrás dos muros de um convento ou mosteiro. Disto temos milhares de exemplos.
Por outro lado, existem homens dinâmicos, peritos em lidar com dinheiro,mestres em política e diplomacia, relações nacionais e internacionais,homens que, depois de mortos, costumam ter estátuas de bronze ou de mármore em praça pública e cujas biografias enchem as prateleiras das bibliotecas. A política parece ser essencialmente dativa, vale pelo que dá ou realiza. A mística parece ser essencialmente receptiva, vale pelo que recebe e pelo que é. Aquela é considerada ativa - esta tem fama de ser passiva; mas são dois enganos, porque nem o político é ativo, nem o místico é passivo. Ambos são dativos-receptivos, ambos ativos-passivos.
A diferença está apenas no maior ou menor grau de datividade ativa e de receptividade passiva. No político é, geralmente, máxima a atividade dativa, ao ponto de esterilizar a sua passividade receptiva - e isto é a desgraça dele! No místico isolacionista é máxima a passividade receptiva e mínima a atividade dativa. Ser dinamicamente passivo, ou passivamente dinâmico - eis o problema central da vida humana, o segredo último da sua grandeza e felicidade e a fonte suprema da sua força realizadora no seio da humanidade.
O homem medíocre, unilateralmente ativo, vive na alucinação coletiva de que é ele mesmo, seu conhecido ego humano, quem realiza grandes coisas no mundo; que é a sua inteligência e astúcia, o seu dinheiro, o seu jeito, a sua erudição, a sua incessante lufa-lufa social, comercial,industrial, política, diplomática, que estes fatores sejam a causa real e última das coisas que ele realiza ou tenta realizar sobre a face da terra.
E se alguém lhe disser que, por detrás de todos esses elementos ponderáveis e palpáveis da sua ruidosa atividade, há um elemento imponderável e intangível que, em última análise, é a fonte inicial e profunda de tudo quanto de realmente grande acontece em sua vida - então esse homem dinâmico meneia a cabeça, incrédulo, e considera poeta, filósofo ou místico, ou pelo menos imprático, o homem que tão estranhas coisas pro fere.
Esse homem ignora o que seja passividade dinâmica serenidade creadora. Não tem consciência do imenso reservatório de forças cósmicas, esse invisível oceano que se alarga, incomensurável,misterioso infinito, para além de todos os horizontes da percepção físico-mental. Para ele só existem os pequeninos arroios e regatos que imanam do seu conhecido ego,correndo não se sabe para onde. Esse homem medíocre e míope nem sequer suspeita que esses próprios arroios e regatos da sua atividade febril vão para o silencioso mar, donde vieram.
Gandhi era duma vasta atividade e duma profunda passividade, e tudo que ele dava a seus semelhantes, na horizontal, recebera-o de Deus, na vertical. Por isso, a hora diária de meditação, primeira hora do dia, e a segunda-feira toda, primeiro dia útil da semana, eram para ele a coisa mais importante, porque eram as silenciosas nascentes da sua passividade dinâmica que alimentavam os ruidosos rios da sua incessante atividade.
O povo deu a Mohandas Karamchand Gandhi o nome de "mahatma", isto é,"grande alma", porque sentia intuitivamente que, para além do cenário das suas visíveis realizações humanas, havia misteriosas regiões de invisíveis realidades divinas - e a sua grandeza estava precisamente na constante ligação do seu mundo visível com o mundo invisível: toda a sua política externa assentava alicerces na sua mística interna.
É fácil trabalhar no mundo visível - o grosso da humanidade profana vive unicamente nesse plano. Mais difícil é contemplar o mundo invisível, longe de todos os mundos visíveis - há um grupo de avançados ascetas místicos que vivem nesse mundo ignoto.Dificílimo é viver de tal modo no mundo invisível que todos os mundos visíveis da nossa vida sejam permeados e vitalizados pela luz desse universo espiritual, e todas as materialidades da existência terrestre sejam como que aureoladas de um halo de poesia e beleza, nascido dessa inefável experiência do reino de Deus em nós.
Muitos são os impuros no meio dos impuros. Poucos vivem puros no meio dos puros. Pouquíssimos conseguem viver puros no meio dos impuros. Esses últimos são os verdadeiros "mahatmas",as grandes almas, os homens cósmicos, plenamente realizados. O supremo alvo do Evangelho do Cristo é a creação desses homens, dessas "novas creaturas em Cristo".
A Índia foi sempre o país clássico dos yoguis, dos ascetas, dos místicos, dos mestres da renúncia e espiritualidade. Gandhi também fundou o seu ashram, ou colônia de retiro espiritual. Era uma espécie de
fazenda onde moravam numerosas pessoas de vida disciplinada e sem propriedade individual. Concentração mental e contemplação espiritual durante a madrugada; abstenção de carne e bebidas alcoólicas; trabalhos manuais e agrícolas; reuniões cultuais - tudo isto se observara no ashram de Gandhi, e ele mesmo era uma espécie de patriarca dessa comunidade.
Até aqui, nada de especial; tudo isto se praticava, havia séculos e milênios, na Índia. Acontece, porém, que esse místico solitário aparece em palácios de reis e chefes de estados, nas grandes cortes européias;toma parte em debates políticos, em torno de problemas nacionais e internacionais; agita questões de grande relevância; porque esse homem é um hábil jurista, formado pela Universidade de Londres, que conhece e usa toda a dialética dos advogados e possui toda a perspicácia dos grandes estadistas.
E no seu próprio país, aparece no Congresso Nacional e pleiteia, contra um poderoso império, a emancipação política de 430 milhões de conterrâneos escravizados; mas não usa de nenhuma das armas materiais de que seus antagonistas se servem. Substituiu a arma pela alma. Esse homem não acumula dinheiro para si; vive em extrema pobreza e simplicidade, nutrindo-se de umas poucas frutas e do leite cru duma cabra, que nem era dele.
Veste um calção e anda descalço, ou de sandálias, mesmo nos salões dos magnatas europeus, que o apelidam jocosamente de "faquir seminu". Pelas mãos desse homem estranho, tão solitário com Deus quão solidário com os homens passam anualmente muitos milhões - mas ele mesmo não possui casa nem terreno e gasta apenas uns centavos por dia para sua manutenção.
Cercado da mais imunda 'política e diplomacia internacional, por espaço de meio século, esse homem não se desvia, por um triz, da sua linha de absoluta verdade e sinceridade; não admite manobras escusas à meia-luz;não conhece jogo bifronte por detrás dos bastidores. Defensor máximo da liberdade de seu povo, admite uma única tirania para si mesmo, a obediência incondicional à "voz silenciosa do interior" (the still small voice), como ele chama a voz da consciência.
O enigma Mahatma Gandhi tão diáfano como a luz solar - e tão misterioso como uma noite estrelada. Sempre solitário em Deus, nunca deixa de ser solidário com os homens.
Com o fenômeno Gandhi entrou a história da humanidade numa nova fase de evolução. Está provado, finalmente, que são compatíveis essas duas coisas tidas por incompatíveis, a mais intensa mística interior e a mais extensa dinâmica exterior, o Deus do mundo e o mundo de Deus. Esse homem realizou na sua vida a grande síntese do espírito e da matéria, do fogo e da água. Nele o Verbo se fez carne e habita em nós. Daqui por diante,o materialista não tem mais justificativa para sua falta de espiritualidade - e o espiritualista não tem mais o direito de desertar do mundo material. Foi realizada a grande síntese, e o que foi possível uma vez na Índia é possível sempre e por toda a parte. O Mahatma não é da Índia,nem do Oriente - ele é do mundo e da humanidade.
Na Idade Média, quando um homem tinha tido o seu contato com Deus, o primeiro passo consistia em se libertar de vez de todas as coisas do mundo; abandonava o mundo de Deus a fim de viver em Deus fora do mundo.O ponto culminante da vida ascética era a deserção do mundo.Com Gandhi aparece uma nova forma de ascese - a ascese da libertação,substituindo e aperfeiçoando a ascese da deserção. Quem deserta das coisas materiais mostra boa vontade - mas não prova verdadeira compreensão. Por que foge? Por que deserta? Porque se sente fraco e receia cair; mas o temor é escravizante.
Plenamente liberto e livre é somente o homem que, depois de se consolidar definitivamente no mundo espiritual, volta ao mundo material sem se materializar; o seu reino não é daqui, mas ele ainda trabalha aqui, como se fosse o mais profano dos profanos. Somente um homem plenamente espiritual pode admitir aparências de materialidade sem desmentir a sua espiritualidade.
De um homem que nada espera do mundo, tudo pode o mundo esperar. Mas há, para além do homem dinamicamente ativo e do homem estaticamente passivo, uma terceira alternativa, que é o homem dinamicamente passivo ou passivamente dinâmico. Com esta qualificação designamos o homem cósmico, esse homem raríssimo que, depois de se identificar totalmente com o seu centro real, com o seu Eu divino, passa a manifestar esta sua implosão mística numa vasta explosão ética, transbordando a sua experiência divina em vivência humana.
Uma vez que o homem atingiu a consciência da paternidade única de Deus, está em condições de realizar a vivência da fraternidade universal dos homens. E, neste caso,a ética não é apenas moralidade, que pode existir mesmo sem a experiência mística; mas o seu agir externo será o espontâneo transbordamento,a irresistível explosão da sua intensa implosão mística.
Quando, um dia, alguém sugeriu a Gandhi a idéia de abandonar o mundo profano da política e retirar-se a uma caverna para viver como, místico,respondeu ele: "Eu trago essa caverna dentro de mim." Quem consegue transferir a "caverna" externa dos místicos para o seu interior,refugiando-se a esse santuário quando sente necessidade, esse atingiu a culminância da sua libertação, a "gloriosa liberdade dos filhos de Deus". Mas, para que alguém atinja essa liberdade deve sujeitar-se voluntariamente à maior das tiranias, à sacrossanta "tirania da silenciosa voz do interior", e prestar obediência incondicional ao divino ditador da consciência. É este o "caminho estreito e a porta apertada que conduzem ao reino de Deus". De maneira que a mais ampla liberdade supõe a mais completa tirania - tirania voluntária.
"A Verdade - escreve- Gandhi -- é dura como diamante, mas é também delicada como flor de pessegueiro." Quem não aceita voluntariamente a dureza diamantina da Verdade, não chegará a fruir a sua delicadeza de flor de pessegueiro. Plenamente livre é somente aquele que voluntariamente se escraviza. E essa espontânea escravidão se refere não somente a Deus, refere-se também aos homens, nossos semelhantes; servir voluntariamente é libertar-se totalmente. Nada mais escravizante do que o desejo de querer-ser-servido - nada mais libertador do que a vontade de querer-servir!
Quem não for escravo voluntário não pode ser homem livre - esse estranho paradoxo caracteriza a vida toda de Gandhi. Tão grande é a liberdade interior desse homem que ele se torna,exteriormente, escravo de seus conterrâneos, escravo do invasor britânico, escravo da humanidade inteira.
Quem não se sente plenamente livre deve evitar servir aos outros e deve assumir ares de dominador, porque onde falta a essência têm de prevalecer as aparências. Mas quem traz dentro de si o testemunho da sua liberdade real, esse pode ser servidor de todos, porque a sua firme liberdade não necessita de ser escorada com pseudo-liberdades. Quem é sábio pode serenamente admitir aparências de tolo; mas o tolo tem de evitar solicitamente essas aparências e assumir ares de sábio, para que a sua pseudo-sapiência não sucumba ao impacto da sua insipiência.
O mundo de hoje não compreendeu ainda a verdadeira grandeza de Gandhi,sem dúvida um dos mais lídimos discípulos que o Nazareno teve entre os homens, nesses quase dois milênios de era cristã. Mas o espírito do Mahatma está trabalhando as consciências humanas, qual divino fermento,levedando aos poucos a massa profana e preparando o caminho para a grande alvorada crística.
Do livro Mahatma Gandhi,páginas de 11 a 24
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
Da Lagarta à Borboleta
A lagarta, ou taturana, é bem o símbolo do homem profano. A borboleta é comparável ao homem iniciado.
A lagarta rasteja pesadamente nas baixadas. O seu corpo desgracioso não é senão boca e estômago.
Para que a lagarta possa tornar se borboleta, é indispensável que passe por uma espécie de morte, a crisálida, ou o casulo. No fim do seu período de lagarta, deixa ela de comer, retira se a uma lugar solitário e lá se metamorfoseia. Não sabemos se ela sofre com esta metamorfose.
E, se sofre, também aceitaria de boa vontade esse sofrimento, porque, instintivamente, a lagarta sabe que o seu verdadeiro estado é o de borboleta alada. Nesse último estado é o inseto completamente diferente da lagarta: com quatro asas velatíneas, meia dúzia de pernas elegantes e flexíveis, dois olhos de opala com milhares de facetas visuais; dispõe de uma língua em forma de espiral contráctil, com o qual suga o néctar das flores.
Em vez de rastejar pesadamente pela terra, a borboleta voa elegantemente pelos espaços ensolarados, donde só desce, de tempos a tempos, para se alimentar duma gotinha de néctar sugado do perfumoso cálice das flores.
Há um contraste frisante entre toda a vida da lagarta e a da borboleta. E toda essa modificação se deu durante a morte da lagarta e o nascimento da borboleta, que é a crisálida, que pode ser comparada com uma meditação profunda.
Durante a verdadeira e completa meditação, o homem fica como morto, imóvel, silencioso, totalmente ensimesmado na consciência espiritual, sem o funcionamento dos sentidos e da mente. A meditação foi comparada pelos mestres espirituais como o egocídio, ou morte voluntária e temporária do nosso ego físico-mental, mas em plena vigília do Eu espiritual. Paulo de Tarso referindo se a esse estado, escreve: "eu morro todos os dias, e é por isso que eu vivo- mas já não sou eu quem vivo, o Cristo é quem vive em mim."
E o próprio Cristo diz: "Se o grão de trigo não cair em terra e morrer, ficará estéril; mas, se morrer, produzirá muito fruto". Um homem que nunca passou por este estado de morte voluntária, continua a ser um homem profano, materialista, interessado somente nas coisas do corpo físico e das emoções.
Como já dissemos, não é o sofrimento como tal que transforma o homem, mas é o sofrimento compreendido e aproveitado. Mas o homem que nunca viveu no seu interior por uma profunda interiorização ou meditação, dificilmente pode sofrer com serenidade, não pode dizer "eu transbordo de júbilo no meio de todas as minhas tribulações".
O homem profano, sem sofrimento transformador, continua a vida inteira como lagarta pesada e comilona- ao passo que o homem que passou por um sofrimento compreendido, e aceito, entra numa atitude de serenidade e leveza, que faz lembrar o adejar silencioso da borboleta, que, apesar disto, continua a manter o contato com a terra.
O sofrimento compreendido e aceito confere ao homem uma intuição estranha das coisas superiores ; dá lhe gosto pelas coisas que, outrora, o desgostavam; dá lhe facilidade de compreender o incompreensível e de ver as coisas invisíveis.
Ninguém pode gostar do sofrimento por causa do sofrimento- que seria masoquismo mórbido- mas que pode querer o sofrimento como um meio e um caminho que conduzem a uma vida superior, que os não- sofredores ignoram.
Esta inefável estesia e clarividência que o sofrimento compreendido produz vale por todas angústias anteriores. O lúgubre fantasma vestido de luto se transformou num querubim luminoso, com a luz da felcidade nos olhos e o sorriso da vida eterna nos lábios.
Quem quiser voar como a borboleta, não tenha medo de morrer como crisálida, depois de ter vivido como taturana.
PORQUE SOFREMOS-PÁGINAS 63 E 64
A lagarta rasteja pesadamente nas baixadas. O seu corpo desgracioso não é senão boca e estômago.
Para que a lagarta possa tornar se borboleta, é indispensável que passe por uma espécie de morte, a crisálida, ou o casulo. No fim do seu período de lagarta, deixa ela de comer, retira se a uma lugar solitário e lá se metamorfoseia. Não sabemos se ela sofre com esta metamorfose.
E, se sofre, também aceitaria de boa vontade esse sofrimento, porque, instintivamente, a lagarta sabe que o seu verdadeiro estado é o de borboleta alada. Nesse último estado é o inseto completamente diferente da lagarta: com quatro asas velatíneas, meia dúzia de pernas elegantes e flexíveis, dois olhos de opala com milhares de facetas visuais; dispõe de uma língua em forma de espiral contráctil, com o qual suga o néctar das flores.
Em vez de rastejar pesadamente pela terra, a borboleta voa elegantemente pelos espaços ensolarados, donde só desce, de tempos a tempos, para se alimentar duma gotinha de néctar sugado do perfumoso cálice das flores.
Há um contraste frisante entre toda a vida da lagarta e a da borboleta. E toda essa modificação se deu durante a morte da lagarta e o nascimento da borboleta, que é a crisálida, que pode ser comparada com uma meditação profunda.
Durante a verdadeira e completa meditação, o homem fica como morto, imóvel, silencioso, totalmente ensimesmado na consciência espiritual, sem o funcionamento dos sentidos e da mente. A meditação foi comparada pelos mestres espirituais como o egocídio, ou morte voluntária e temporária do nosso ego físico-mental, mas em plena vigília do Eu espiritual. Paulo de Tarso referindo se a esse estado, escreve: "eu morro todos os dias, e é por isso que eu vivo- mas já não sou eu quem vivo, o Cristo é quem vive em mim."
E o próprio Cristo diz: "Se o grão de trigo não cair em terra e morrer, ficará estéril; mas, se morrer, produzirá muito fruto". Um homem que nunca passou por este estado de morte voluntária, continua a ser um homem profano, materialista, interessado somente nas coisas do corpo físico e das emoções.
Como já dissemos, não é o sofrimento como tal que transforma o homem, mas é o sofrimento compreendido e aproveitado. Mas o homem que nunca viveu no seu interior por uma profunda interiorização ou meditação, dificilmente pode sofrer com serenidade, não pode dizer "eu transbordo de júbilo no meio de todas as minhas tribulações".
O homem profano, sem sofrimento transformador, continua a vida inteira como lagarta pesada e comilona- ao passo que o homem que passou por um sofrimento compreendido, e aceito, entra numa atitude de serenidade e leveza, que faz lembrar o adejar silencioso da borboleta, que, apesar disto, continua a manter o contato com a terra.
O sofrimento compreendido e aceito confere ao homem uma intuição estranha das coisas superiores ; dá lhe gosto pelas coisas que, outrora, o desgostavam; dá lhe facilidade de compreender o incompreensível e de ver as coisas invisíveis.
Ninguém pode gostar do sofrimento por causa do sofrimento- que seria masoquismo mórbido- mas que pode querer o sofrimento como um meio e um caminho que conduzem a uma vida superior, que os não- sofredores ignoram.
Esta inefável estesia e clarividência que o sofrimento compreendido produz vale por todas angústias anteriores. O lúgubre fantasma vestido de luto se transformou num querubim luminoso, com a luz da felcidade nos olhos e o sorriso da vida eterna nos lábios.
Quem quiser voar como a borboleta, não tenha medo de morrer como crisálida, depois de ter vivido como taturana.
PORQUE SOFREMOS-PÁGINAS 63 E 64
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